Acordei cedo e,
como de costume, tomei café da manhã, vesti-me a rigor e saí às pressas de
casa. O movimento das ruas estava reduzido naquela hora. Mas como? Todos os
dias têm sido tão movimentados...
Pensei... Pensei... E
lembrei: -Ah, hoje é feriado!
Voltei para casa, deitei
na minha cama e, mesmo sabendo que era dia de descanso, comecei a planejar o que
fazer, num dia tão bonito e ensolarado.
Antes de sair de casa,
gritarei na janela a fim de acordar a todos, visitarei um velho amigo,
almoçarei em sua casa e, depois, irei a locais nos quais costumava freqüentar
para me distrair e pensar sobre a vida.
Quero lavar a alma e
realizar todos os meus loucos desejos até então acumulados e reprimidos pelo
meu consciente no momento em que achar mais conveniente.
Farei um poema e uma
música, sem estar nada inspirado e sem conhecer o dó.
Tirarei os sapatos e
andarei sozinho no parque cheio de gente. Avulso na multidão, roubarei uma
flor, brincarei no parquinho e tomarei sorvete.
Guardarei numa garrafa de
refrigerante muitos raios de sol para os dias de chuva, muitas felicidades para
os dias de tristezas e melancolias.
Cumprimentarei a todos,
conhecidos ou desconhecidos, amigos ou inimigos. Sorrirei mais e melhor.
Rasgarei cartas, retratos e tudo aquilo já escrito por mim. Deixarei os erros
do passado para segundo plano.
Romperei paradigmas.
Caminharei pela rua sem
compromisso, sem destino, com as mãos nos bolsos e com os cabelos soltos,
sentindo-os roçar pela minha face e ombros. Sentirei o vento gelado soprar na
direção contrária ao meu percurso. Cantarei com a voz que nunca tive.
Lembrarei da garota que
teve muito significado para mim e ligarei para ela, perguntando como ela está.
Esquecerei a
sintaxe, a colocação pronominal, o drama da pontuação, os exames finais, os
estudos e compromissos do cotidiano. Concentrar-me-ei no que me traz
tranqüilidade.
Ficarei o restante do dia
ao relento, em companhia do vinho, deitado sobre um gramado, observando os
lírios, os pardais, os periquitos...
Irei assistir às novas
atrações do cinema e comprarei pipoca do seu Zé.
Esquecerei a sociedade, a
democracia, a política, os jornais e revistas, a filosofia, a matemática, as
guerras no Oriente Médio, as mediocridades veiculadas pela televisão.
À noite, chegarei em
casa, lerei um bom livro e tentarei dormir depois.
E amanhã, amanhã sim,
reassumirei meu lugar no mundo, sem juntar mais do chão aquela saudade que
estava dentro de tudo.
Farei tudo isso hoje,
porque hoje é feriado.
Anderson Batistello - 16/02/2002